segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Amanhã Nunca Mais X Jardim das Folhas Sagradas: Exagerados

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Uma das falhas mais tristes que afligem cineastas estreantes é a vontade de abraçar o mundo em apenas um filme. Dois títulos nacionais que estreiam no final de 2011 exemplificam esse mal.

O mais triste é que os diretores de Amanhã Nunca Mais e Jardim das Folhas Sagradas não são totalmente inexperientes. Tadeu Jungle tem vivência no mercado publicitário e Pola Ribeiro tem uma longa carreira como curtametragista. Mesmo assim, ambos não conseguiram conter os ânimos em seus primeiros longas.


Jungle se empolgou demais na forma em detrimento ao conteúdo. Amanhã Nunca Mais conta a história de um anestesista em crise no casamento. Para mostrar seu valor, ele se voluntaria para pegar o bolo de aniversário de sua filha. A tarefa poderia ser simples, mas em seu caminho estão uma série de personagens insanos.

Os tipos loucos deveriam ser engraçados, mas são tão exagerados que só conseguem motivar a raiva do espectador. Se a história fosse mais simples, Jungle poderia ter entregue uma comédia despretensiosa e divertida. Os desfecho também exala o exagero do filme.

Pola Ribeiro, com Jardim das Folhas Sagradas, foca-se demais no conteúdo e se perde. Como o próprio cartaz mostra, o filme fala de questões ambientais, homossexualidade e preconceito de credo.


O filme protagonizado por um pai de santo que precisa fundar um terreiro tinha tudo para tratar apenas do último dos temas listados. O fato do personagem principal ser homossexual é totalmente inútil para o andamento da história.

Se os nossos cineastas exageram na mão e entregam filme desencontrados, a crítica especializada também precisa fazer sua parte. Quando uma produção despretensiosa como Cilada.com é lançada, não podemos nos empolgar e usar todo nosso armamento argumentativo contra o filme.

Se os críticos sempre exigem alto nível técnico e de conteúdo, uma das consequências é essa epidemia de pretensão e exageros.

domingo, 30 de outubro de 2011

A Casa dos Sonhos X Ilha do Medo: Trailers reveladores

por Edu Fernandes


Spoilerômetro: (?) - trailer de A Casa dos Sonhos


Os thrillers psicológicos A Casa dos Sonhos e Ilha do Medo têm trailers que praticamente contam filmes inteiros. A concordância de contaúdo entre trailer e filme mostra os distintos níveis de qualidade entre os dois títulos.

O trailer de A Casa dos Sonhos (Dream House) revela muitos segredos de sua trama. O conteúdo do material promocional foi um dos vários motivos de conflito entre o diretor Jim Sheridan (Entre Irmãos) e os executivos da Morgan Creek. A briga foi tão feia que atores e o diretor se recusaram a promover o filme.


A razão por trás dessa questionável opção dos produtores está no fato de que, afora o elenco encabeçado por Daniel Craig (Cowboys e Aliens), Rachel Weisz (Um Olhar do Paraíso) e Naomi Watts (Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos), o filme não tem muitos atrativos sem que se revele alguns segredos do enredo.

A história de uma família que se muda para uma nova casa, cenário de mortes violentas e misteriosas, não transpira originalidade. Até o cartaz com as duas filhas dos personagens principais remete a uma cena antológica de O Iluminado (1980).

Como o filme não pode contar com o efeito do boca-a-boca positivo (nos Estados Unidos, o longa sequer foi exibido para a crítica), é preciso convencer o espectador a ir ao cinema logo na primeira semana em cartaz. Nem que, para isso, abra-se mão do ponto de virada do roteiro.


No caso de Ilha do Medo (Shutter Island), as coisas são um pouco diferentes. Seu trailer praticamente conta um filme inteiro. Quando é assistido, percebe-se que o filme em si é bem diferente do que se vende no trailer.

Como o longa dirigido por Martin Scorcese (Os Infiltrados) é de boa qualidade, os produtores podem usar de tal manobra. Dessa forma, potencializa a surpresa do roteiro e aumenta-se o efeito do boca-a-boca.





sexta-feira, 28 de outubro de 2011

O Levante*: Microcosmo maduro

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)

* Esclarecimento: O filme mudou de nome entre sua exibição na Mostra de São Paulo e sua estreia comercial. O novo título escolhido foi Juan e a Bailarina.

Como incontáveis outros filmes, O Levante (La sublevación) usa a chegada de um forasteiro para mostrar uma sociedade fechada em si. No caso, um asilo. Tal tática é muito conveniente para facilitar a apresentação dos personagens, já que o próprio espectador também é um forasteiro.

A “estranha no ninho” é Alícia, que acaba de perder o filho e é abandonada pela nora na casa de repouso. Lá ela terá de lidar com a saudade que sente do neto e conviver com outros idosos.

Antes que o leitor ache o roteiro sem originalidade, não é apenas pelos olhos da forasteira que os personagens são apresentados. Há uma cena, em que se lê o testamento e partilham-se os bens de uma das moradoras do asilo, para trazer novas figuras para o cenário. Além disso, a cena estabelece o tom de humor dessa comédia dramática.

A aparente paz do local é perturbada por dois elementos. Primeiramente, a notícia que chega pela televisão de que Jesus foi clonado torna-se o assunto da vez. Fora dos assuntos do Vaticano, a preocupação mais próxima aos personagens são as férias da enfermeira Rosa.Em seu lugar é deixado o filho dela, apelidado de A Bruxa por causa da forma nada amistosa com que ele trata os moradores do asilo.

A questão da clonagem de Jesus funciona como a força-motriz do enredo. Os personagens estão sempre curiosos em saber os desdobramentos da notícia. O problema é que um assunto tão polêmico não pode ser deixado apenas como motivador da história central. Corre-se o risco de que o interesse do público fique deslocado.

Como em Almoço em Agosto, por exemplo; O Levante aposta no carisma da terceira idade para que a atenção seja dedicada a seus personagens.

O Levante (La sublevación)
Roteiro e Direção: Raphael Aguinaga
Elenco: Hugo Alvarez, Lidia Catalano, León Dogodny, Vilma Ferrán, Juan Carlos Galván, Arturo Goetz, Pablo Lapadula
Duração: 90 minutos
País: Brasil, Argentina

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

A Alma Roqueira de Noel: Boas tenções

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


O ditado diz “Se Deus lhe dá limões, faça um limonada”, mas parece que A Alma Roqueira de Noel quer fazer um suco de laranja. O documentário acompanha os ensaios, apresentações e todo o processo de aproximação do roqueiro Paulo Miklos (Titãs) com a obra de Noel Rosa.

As imagens obtidas nas apresentações, especialmente no Auditório do Ibirapuera (SP), renderiam um belo DVD musical. As demais gravações, de ensaios e conversas, funcionariam como extras pra completar o pacote.

Assim, o documentário que se obtém parece um sessão demonstrativa do tal DVD imaginário, em que trechos são exibidos aleatoriamente. Alguns depoimentos são repetitivos e a falta de uma explicação mais detalhada da história de vida de Noel Rosa parecem ter ficado de fora da sessão.


O encontro de Paulo Miklos com o samba começou durante a preparação para É Proibido Fumar. A partir daí, o músico e ator mergulhou na tradição do estilo musical. Ele foi convidado para participar das comemorações do centenário de Noel Rosa e assim nasceu o show com o Quinteto em Branco e Preto.

A voz de Miklos traz frescor à obra de Noel. A participação especial de jovens cantoras mostra que as canções do compositor carioca continuam relevantes para as novas gerações de músicos.

Junto ao público, a situação se espelha. Nas apresentações do Ibirapuera e da Virada Cultural, a pluralidade de idades dos presentes impressiona e assegura que as rimas de Noel serão ouvidas ainda por muito tempo.

* Este texto foi batizado com o nome de uma das canções de Noel Rosa.




A Alma Roqueira de Noel Rosa
Roteiro e Direção: Alex Miranda
Elenco: Paulo Miklos, Quinteto em Branco e Preto
Duração: 70 minutos
País: Brasil

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Contágio: Uma espécie doente

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)



Pelos relatos de alguns veículos de imprensa na época parecia que a gripe suína era uma doença que ameaçava a humanidade. Passado o pânico, percebeu-se que a taxa de mortalidade dessa variação da doença era igual a das outras gripes.

Todo esse cenário de medo e paranoia é explorado por Contágio (Contagion), com outra patologia. O filme conta as complicações de uma pandemia, sejam tais consequências de cunho médico ou não. Em um sólo fértil para o nascimento de teorias da conspiração, saques a comércio e outros mates, o filme consegue equilibrar várias tramas paralelas.

Uma delas é encabeçada por Matt Damon que, coincidentemente ou não, participa mais uma vez de um filme cuja premissa surge para criticar os exageros da mídia – Zona Verde mostrava como o sensacionalismo cego colaborou para o início da Guerra do Iraque.

Nas cenas de Contágio em que as situações-limite afloram o pior do ser humano, muitos se lembrarão da adaptação cinematográfica de Ensaio sobre a Cegueira. Assim como o filme de Fernando Meirelles, a nova produção usa a direção de fotografia a favor da narrativa.


Com luzes claras estouradas, Ensaio sobre a Cegueira pretende deixar que seu espectador prove a cegueira branca narrada nas páginas de Saramago. Em Contágio, a luz deixa os personagens pálidos ou corados, dependendo do teor das cenas e da relação deles com a epidemia.

A doença ficcional retratada no filme é transmitida muito facilmente de pessoa para pessoa. Por essa razão, e pelos closes dados em objetos do dia a dia que podem carregar o vírus, quem tem mania de limpeza e sanitarismo pode sair da sala de cinema paranoico.





Contágio (Contagion)
Direção: Steven Soderbergh
Roteiro: Scott Z. Burns
Elenco: Matt Damon, Kate Winslet, Jude Law, Gwyneth Paltrow, Laurence Fishburne, John Hawkes, Marion Cotillard
Duração: 106 minutos
País: EUA, Emirados Árabes Unidos

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

O Preço do Amanhã: Alegoria capitalista

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Algumas ficções científicas vão além de explorar situações interessantes que o gênero oferece para tratar de assuntos sérios na forma de alegorias e comparações. O Preço do Amanhã (In Time) é um desses exemplos.

O filme estrelado por Justin Timberlake (A Rede Social) se passa no futuro, quando as pessoas param de envelhecer aos 25 anos de idade. Depois disso, um relógio regressivo começa a rodar no braço esquerdo de casa pessoa. Quando ele zerar, é morte certa. O figurino se preocupa em criar roupas de mangas compridas ou luvas longas para que os personagens mantenham a privacidade da quantidade de tempo que possuem.

Para continuar vivo cada indivíduo precisa ganhar tempo, que é a moeda corrente nesse cenário. Dessa maneira, os ricos são praticamente imortais e os pobres precisam ganhar cada dia de sua sobrevivência.

O Preço do Amanhã faz uma crítica ao sistema capitalista. É claro que tudo com muita perseguição e cenas de ação. Assim, há algo para quem quer ver além da aventura sem perder o entretenimento.

Por essa razão é preciso relevar que nem todos os detalhes do cenário estão claros. Um exemplo: não se sabe como os empregados dos ricos chegam aos isolados distritos onde mora a elite.

No entanto, a estrutura do sistema está lá. Os ricos cientes de que é necessário o sacrifício de muitos pobres para sustentar seus luxos. Por sua vez, os mais humildes vivem em constante medo e na pressão de seus relógios com poucos dias para viver.

Para assegurar o status quo existem os guardiões do tempo. Os agentes dessa força policial ganham pouco por seu trabalho, mas usam toda sua determinação para cumprir sua missão e manter o sistema em equilíbrio.

O Preço do Amanhã faz o mesmo que Planeta dos Macacos (preconceito racial) e Contato (consciência ambiental) e torna-se mais um dos bons exemplos de filmes hollywoodianos em que existe um pouco de cérebro.




O Preço do Amanhã (In Time)
Roteiro e Direção: Andrew Niccol
Elenco: Justin Timberlake, Amanda Seyfried, Cillian Murphy, Olivia Wilde, Shyloh Oostwald, Matt Bomer, Johnny Galecki, Alex Pettyfer
Duração: 109 minutos
País: EUA

Esclarecimento aos leitores: Cobertura da Mostra

 por Edu Fernandes

Todo ano, a mesma coreografia de passos marcados se repete em minha carreira de crítico de cinema. O resultado final é eu ter de dar um jeito de cobrir a Mostra de Cinema de São Paulo sem conseguir credenciamento pela assessoria do evento. A única exceção foi no ano de 2010, quando eu estava designado a cobrir o festival pelo UOL.


Em 2011, fora do UOL, a rotina se repete. A Mostra alega que eu não fiz o meu pedido de credenciamento dentro do prazo, mas encaminhei o meu comprovante de pedido.

Depois de começada a Mostra, sem receber retorno positivo ou negativo, entrei em contato com a assessoria repetidas vezes até conseguir a resposta que meus leitores merecem conhecer.

Segue a explicação dada pela assessoria da Mostra:

“Recebemos cerca de 600 solicitações de credenciais e a organização da Mostra faz sim uma seleção pois temos um número limitado para atender a imprensa e precisamos de valoração do clipping para apresentar aos patrocinadores ao final do trabalho”.

Com essa mentalidade, veículos com larga tradição em crítica cinematográfica como revistas de fofocas encontradas em salão de beleza têm suas credenciais para ver filmes, apesar de só publicarem fotos de celebridades.

Não sou ingênuo e já me preparei para essa situação antes mesmo de ela se concretizar. Entrei em contato com assessoras de filmes e empresas do ramo para conseguir ver alguns filmes que estão na programação da Mostra.

Com essas oportunidades, mais os filmes assistidos durante o Festival do Rio e que ainda não escrevi textos, conseguirei oferecer aos meus leitores uma cobertura da Mostra. Longe do ideal, mas dentro do possível – dadas as condições que me são impostas. Já faço muito trabalho de graça, mas pagar para trabalhar está fora de cogitação.


Os comentários estão abertos para que pessoas ligadas a Mostra deem o seu lado da história.

ATUALIZAÇÃO: A Mostra já se mexeu para solucionar a situação. Conseguirei assistir a alguns filmes com a ajuda da assessoria do evento. 

domingo, 23 de outubro de 2011

Os 3 x Triângulo Amoroso: Amores triplos

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Como fazem questão de ressaltar alguns políticos conservadores, um casal é tradicionalmente formado por um homem em uma mulher. À margem da produção cultural GLBT, alguns filmes testam tal limite com casais formados por dois homens e uma mulher.

Nesse final de 2011, estão programados para estrear dois filmes com esse conjunto de personagens: o nacional Os 3 e o alemão Triângulo Amoroso (3).


Os Três conta a história de universitários que moram em um mesmo apartamento. O filme mostra uma parcela da juventude contemporânea, que não consegue se encaixar plenamente nas orientações sexuais estabelecidas. Logo no começo, os dois personagens masculinos falam sobre experiências homossexuais de seus passados, sem que isso influencie os interesses heterossexuais atuais.

Os personagens começam um jogo de sedução que é potencializado pela oportunidade de participarem de uma espécie de um reality show. Os sentimentos conflituosos começam a aflorar enquanto os jovens vivem uma farsa diante das câmeras.


Nesse caso, o que se percebe é que a harmonia do casal só é plena quando o amor é vivido a três. O mesmo tipo de dinâmica pode ser vista na produção espanhola Dieta Mediterrânea. Esse filme faz a já consagrada mistura entre prazer gastronômico com o sexual.


A outra produção que deve entrar em cartaz no Brasil em 2011 com essa temática é Triângulo Amoroso. Nesse caso, tudo começa por conta do adultério do casal de personagens principais. Ambos começam a se envolver secretamente com Adam. Hanna é sua colega de trabalho e o marido dela encontra com Adam em uma piscina pública.

O que deveria ser apenas uma aventura para os três começa a tomar contornos mais complexos quando os sentimentos entram em jogo. Tudo isso com a questão do segredo para complicar. Adam mostra que a situação escapa do campo da aventura sexual quando percebe estar apaixonado pelos dois, sem saber que na verdade são um casal.

Em Triângulo Amoroso há o lance da homossexualidade, como em Três Formas de Amar (1994). Na produção americana, os envolvimentos são mais públicos e o jogo de atração parece não agradar plenamente a qualquer um dos envolvidos. A moça é apaixonada pelo gay, que é apaixonado pelo hetero, que é apaixonado pela moça.

Todos esses exemplos de uma relativa harmonia entre dois homens com uma mulher leva a pensar por que é menos comum ver essa dinâmica com duas mulheres e dois homens. Para essa discussão, convido os leitores para deixar comentários.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A Condenação: A força de uma mulher

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Em 2002, o programa jornalístico 60 Minutes mostrou uma matéria sobre Betty Anne Waters. O irmão dela foi preso no começo dos anos 80 e, depois de todos os recursos cabíveis na defensoria pública, condenado a prisão perpétua por assassinato. Beth na época não tinha sequer o ensino fundamental. Mesmo assim, ela foi atrás de completar seus estudos e se formar como advogada para conseguir provar a inocência do irmão.

Diante de uma jornada heroica de tamanha magnitude, começou uma pequena guerra para adquirir os direitos de mostrar tal história no cinema. Quase uma década depois do programa televisivo, é lançado o filme A Condenação (Conviction).

Quando se tem uma protagonista como Betty Anne Waters, é fácil conseguir emotividade na hora de narrar sua história. Por essa razão, o filme poupa-se de ousar ou exagerar em qualquer sentido. A aposta é toda no enredo. O resultado agradou a Betty Anne Waters. Ela disse: “O filme é tão fiel à vida. Nem todas as cenas aconteceram de verdade, mas cada emoção aconteceu”.

Betty é interpretada por Hilary Swank (Amelia). As duas foram se conhecer depois de iniciadas as filmagens. Hilary não queria fazer uma imitação e sim uma interpretação autêntica.

A atriz, como os demais colegas de elenco, consegue um registo sincero, mas não excepcional. A exceção fica para Melissa Leo (O Vencedor), que rouba a cena em sua breve participação no filme.








A Condenação (Conviction)
Direção: Tony Goldwyn
Roteiro: Pamela Gray
Elenco: Hilary Swank, Sam Rockwell, Minnie Driver, Melissa Leo
Duração: 107 minutos
País: EUA

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

O Discurso do Rei: Plano Geral

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


A história do filme O Discurso do Rei impressiona por ser algo tão fantástico quanto real. A amizade do rei George VI com seu fonoaudiólogo foi retratada no cinema entre os anos 20 até no começo da Segunda Guerra Mundial. Como os próprios créditos finais indicam, a relação entre os dois foi bem mais duradoura do que o período em que o filme se trata.

Para saber o que aconteceu nesses anos que não estão no filme oscarizado, os mais curiosos podem ler O Discurso do Rei: Como um Homem Salvou a Monarquia Britânica (The King’s Speech). O volume conta desde a infância até a morte do monarca britânico e a do seu terapeuta australiano.

O livro foi co-escrito por Mark Logue, neto de Lionel Logue, o fonoaudiólogo do rei. Mark não teve muito contato com o avô e só pensou em escrever um livro sobre a relação de seu antepassado com a Família Real depois de ser contatado pela equipe de produção do filme estrelado por Colin Firth e Geoffrey Rush.

Graças a muitas cartas e registros em diários, Mark Logue e Peter Conradi conseguem recriar os acontecimentos que ocorreram durante muitas décadas. Os encontros entre os dois personagens principais e toda a evolução do paciente são contados do ponto de vista mais humano, sem se preocupar em investigar quais técnicas eram empregadas para que o nobre conseguisse vencer sua gagueira.

No meio do livro, há um caderno com fotos da família Logue e imagens oficiais referentes ao reinado de George VI. Elas ajudam o leitor a imaginar os eventos narrados nas páginas.

Pela leitura é possível perceber as manobras que o roteiro executa para conseguir comprimir uma amizade tão longeva em menos de duas horas de projeção. O filme foi fiel à atmosfera, mas tomou algumas liberdades em relação aos fatos.

O Discurso do Rei: Como um Homem Salvou a Monarquia Britânica (The King’s Speech)
Autor: Mark Logue, Peter Conradi
Tradução: Sônia de Souza, Celina Portocarrero
Editora: José Olympio
Páginas: 280

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Festival do Rio: Premiados e balanço

  por Edu Fernandes


Entre os prêmios compreensíveis e honrarias questionáveis, A Hora e a Vez de Augusto Matraga foi o grande vencedor do Festival do Rio 2011. A adaptação cinematográfica da obra de Guimarães Rosa conta sua história sem ousadias. Com isso, o filme levou a premiação máxima na escolha do público (compreensível) e do júri (questionável).


Os atores do filme de Vinícius Coimbra também foram premiados. Sem um franco favorito entre os protagonistas, a escolha de João Miguel não é injusta e não chega a ser uma surpresa. Chico Anysio recebeu um prêmio especial por sua atuação em Matraga. Já o troféu que foi entregue a José Wilker poderia muito bem ser entregue para Irandhir Santos, sem sair do mesmo filme. Outras escolhas incluiam Gero Camilo (Eu Receberia...) ou Otto Jr. (O Abismo Prateado).

Aliás, um dos melhores filmes da Premiére Brasil foi lembrado apenas pela direção de Karim Aïnouz. O Abismo Prateado poderia e mereceria mais prêmios.

Apesar da menção honrosa do júri, Mãe e Filha ficou apenas com meio prêmio. A produção cearense empatou com Sudoeste na direção de fotografia. Premiar um filme preto e branco nessa categoria não é o auge da criatividade.


Sudoeste também foi o favorito da crítica (Fipresci), que procurou um cinema mais provocativo. O título também recebeu o prêmio especial do júri.

Entre os documentários, conforme o esperado, Eduardo Coutinho levou o prêmio do júri e do público por As Canções. Olha para Mim de Novo recebeu uma menção honrosa. A surpresa veio para melhor montagem. O prêmio que é normalmente dado entre as ficções foi entregue para Marcelo Yuka: No Caminho das Setas.

Entre as atrizes, como pedia o público, Camila Pitanga levou por Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios. Maria Luísa Mendonça foi escolhida a melhor coadjuvante por Amanhã Nunca Mais. No filme, como em muitos outros de sua carreira, Maria interpreta uma mulher louca.


Quem achava que as piadas sem graça de A Novela das 8 se resumiam na tela ficou consternado (para dizer o mínimo) com a premiação de roteiro. Dizia-se em rodas de fofoca que o diretor/produtor/roteirista Odilon Rocha é bem relacionado com a direção do Festival do Rio. A ética pede que isso não passe de fofoca.

Como acontece todo ano, durante sua premiação o Festival do Rio se transveste em um evento dedicado ao cinema mudo, já que não há premiação para som ou música.

Antes mesmo de começar a cerimônia, comentava-se o vazamento do campeão da noite pelo twitter. Sérgio Sá Leitão, presidente da RioFilme, tinha publicado no micro-blog que A Hora e a Vez de Augusto Matraga seria o grande vencedor. Mais uma vez, Leitão mostrou um comportamento de quem parece procurar mais holofote do que os filmes que representa.

Filmes avaliados

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Atividade Paranormal 3: Submissão e masoquismo

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Há uma vertente recente que assola do cinema estadunidense. Desde o assombroso sucesso de A Bruxa de Blair (1999), uma série de produções se diz constituída de gravações reais de fenômenos sobrenaturais. Em 2007 começou outra franquia que faz uso desse subterfúgio para amedontrar seus espectadores.

Atividade Paranormal 3 (Paranormal Activity 3) usa todos os recursos estéticos dessa forma de terror, mas abdicou de tentar enganar seu público se fazendo passar por algo real (algumas das produções do gênero não têm créditos finais e até escondem o verdadeiro nome de seus atores).

A franquia faz um caminho narrativo interessante. Conforme um novo filme chega, na verdade o que se revela são eventos anteriores aos títulos mais antigos. Nessa lógica, Atividade Paranormal 3 conta a infância de Katie, personagem presente desde o primeiro capítulo da série.

Em 1988, a casa onde ela mora com sua mãe, irmã e padastro começa a se tornar o cenário de eventos inexplicáveis. Dennis, o padastro, trabalha com filmagens de casamentos. Depois de uma estranha imagem gravada quando uma câmera é deixada ligada durante um terremoto, o rapaz decide instalar câmeras pela casa para tentar entender o que está acontecendo.

É nesse ponto em que o terceiro terror torna-se refém de suas amarras. Para conseguir dar sentido para tudo o que se passa, em algumas cenas não há uma razão clara para a câmera estar ligada. Em outros momentos, o roteiro força a barra para que os personagens carreguem a câmera para onde algo interessante acontece. Faria mais sentido se, no calor do momento, o aparelho fosse deixado para trás.

Por outro lado, o mérito dos sustos e da tensão deve ser creditado a Atividade Paranormal 3. Toda a apreensão que o espectador sentirá ao ver o filme é obtida na confiança de uma direção de câmera bem pensada e em uma história intrigante. Assim, suor na palma da mão, uma inquietação na poltrona e o coração acelerado será uma constante para quem está disposto a enfrentar esse filme.

A flexibilidade de não tentar parecer filmagens reais não foi tão grande a ponto de incluir trilha musical no filme. Diferente do que acontece com Quarentena (2008), não é inventada uma desculpinha do tipo canos-velhos-que-rangem-exatamente-nos-momentos-tensos para que o filme tenha uma trilha musical.




Atividade Paranormal 3 (Paranormal Activity 3)
Direção: Henry Joost, Ariel Schulman
Roteiro: Christopher B. Landon
Elenco: Lauren Bittner, Chloe Csengery, Christopher Nicholas Smith, Jessica Tyler Brown
Duração: 84 minutos
País: EUA

domingo, 16 de outubro de 2011

O Palhaço: Dois tempos

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Quando Selton Mello fez sua estreia como diretor com Feliz Natal (2008), disse que considerava o longa um “bom primeiro filme”. O Palhaço vem confirmar o pressentimento que surgiu anos atrás.

Além de oferecer ao público uma obra mais madura, Selton aceita o desafio de dirigir a si mesmo. Por essa razão, O Palhaço significa dois passos adiante em sua carreira como diretor de cinema. O filme conta a história de Benjamin, um palhaço que sofre uma crise de identidade. Seu conflito se resume em uma de suas falas: “Eu faço as pessoas rirem, mas quem me faz rir?”.

Para não tornar-se um material denso, que poderia afastar o grande público, o filme opta por um caminho muito mais leve. Prova disso são as deliciosas participações especiais, quase sempre cômicas. Eis uma lição para os filmes-festa de Xuxa Meneghel, nos quais os convidados disputam para ver quem faz a participação especial mais absurda.


Além de divertir, O Palhaço emociona seu respeitável público com uma história que mostra a força da família circense. Com o estilo de vida nômade que essa arte demanda, o filme ganha ares de road movie – o que abre as oportunidades para as tais participações especiais.

A história se passa em décadas passadas, sem deixar bem preciso o ano. Para ver a situação atual dos profissionais do circo, é aconselhável assistir ao documentário Pindorama - A Verdadeira História dos Sete Anões (2007).

Depois da sessão dupla, ficam algumas questões. Por que um certo banco brasileiro patrocina trupes estrangeiras que combram cerca de R$ 20 por um balde de pipoca? Não seria mais proveitoso (e justo) apoiar artistas brasileiros, que passam por dificuldades?






O Palhaço
Direção: Selton Mello
Roteiro: Selton Mello, Marcelo Vindicato
Elenco: Selton Mello, Paulo José, Larissa Manoela, Giselle Motta, Teuda Bara, Álamo Facó, Cadu Fávero, Erom Cordeiro, Hossen Minussi, Maíra Chasseraux, Thogun, Bruna Chiaradia
Duração: 88 minutos
País: Brasil

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Caminho para o Nada: Talvez se pergunte onde está

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


O pretexto narrativo de Caminho para o Nada (Road to Nowhere) é a reconstrução de um assassinato seguido de suicídio em um filme dentro do filme. A proposta em si já é bem complexa,o  que não impede que o longa desafie a todo momento o limite entre realidade e ficção.

Na maior parte do tempo, vemos a perspectiva do diretor do filme dentro do filme. O fato do protagonista Mitchell Haven ter as mesmas iniciais do diretor Monte Hellman não é mera coincidência. Trata-se de mais um elemento que alerta a diluição da fronteira entre verdade e arte.

O roteiro é bem intrincado e contado de forma não linear, com elementos novos sobre o assassinato surgindo de tempo em tempo. Por essa razão, é compreensível que grande parte dos espectadores se sinta perdido no começo da projeção. Aos bravos que persistirem em acompanhar a história, Caminho para o Nada oferece um quebra-cabeça interessante, cujas peças são entregues para a plateia para que cada um o monte dentro de sua própria mente.


Para deixar tudo mais nebuloso, os atores do elenco são figuras desconhecidas do grande público. Dessa maneira, é possível acreditar que tudo aquilo é verdade.

Por outro lado, em alguns momentos, quando já se está bem inserido em uma determinada cena, ouve-se o personagem principal gritar um “Corta!” bem sonoro, como um tapa na cara do espectador, meio que para lembrar que tudo aquilo é mentira.

Esse jogo de enganação permeia todo o filme, com isso tem-se uma obra para poucos, mas que ficarão ironicamente contentes em serem surpreendidos e de caírem nos truques planejados pela mente de Monte Hellman.

* O título desse texto é a tradução de um dos versos da música "Road to Nowhere", da banda The Talking Heads.




Caminho para o Nada (Road to Nowhere)
Direção: Monte Hellman
Roteiro: Steven Gaydos
Elenco: Shannyn Sossamon, Tygh Runyan, Cliff De Young, Waylon Payne, Dominique Swain, Rob Kolar
Duração: 121 minutos
País: EUA

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

A Criança da Meia Noite: Doenças contemporâneas

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


O personagem principal de A Criança da Meia Noite (La permission de minuit) é um garoto que tem uma doença genética rara chamada XP. Sua pele não processa corretamente os raios UV e, por isso, Romain (Quentin Challal) não pode se expor à luz solar.

Considerando a safra atual de filmes sobre vampiros, não é de se surpreender se um desavisado achar que a produção francesa é mais um nessa lista sangrenta. Na verdade, trata-se de um drama no qual a doença é apenas o gatilho. Por causa dela, Romain é abandonado pelo pai e vê no Dr. David (Vincent Lindon, de Bem-Vindo) uma figura paterna substituta.


O mal genético retratado em A Criança da Meia Noite também é estrela de outros filmes, como no caso das crianças de Os Outros (2001). Nesse caso, a doença é apenas uma desculpa fantasiosa. Por ser uma anomalia recessiva, muito dificilmente dois irmãos (que não sejam gêmeos idênticos) teriam a síndrome.

XP não é a única doença de A Criança da Meia Noite – as demais não são clínicas. A maioria dos portadores da síndrome morre na casa dos 20 anos. Ciente disso, a revolta do adolescente Romain é maior do que aquela que é típica de sua idade.

O filme poderia ser um drama muito mais intenso, se não caísse na mania francesa de alongar os conflitos e discussões a níveis que só Walcyr Carrasco consegue fazer. Um pouco mais de síntese e emotividade fariam bem à saúde do longa.






A Criança da Meia Noite (La permission de minuit)
Roteiro e Direção: Delphine Gleize
Elenco: Vincent Lindon, Emmanuelle Devos, Quentin Challal
Duração: 110 minutos
País: França

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Entre Segredos e Mentiras: Liberdade de expressão e coragem


 por Edu Fernandes 

Spoilerômetro: (?)


Tradicionalmente o cinema procura contar histórias que os espectadores querem ver. O filme Entre Segredos e Mentiras (All Good Things) narra os acontecimentos reais que fizeram um bilionário ser considerado inocente de assassinato, mesmo quando muitas provas apontavam no sentido contrário.

Essa trama, com potencial de indignação, não é algo que muitas pessoas querem ver na tela. Por essa razão, o roteiro se concentra no lado psicológico do caso. O resultado é um thriller pungente.

O filme deve muito de suas qualidades ao empenho dos atores Ryan Gosling (Amor a Toda Prova) e Kirsten Dunst (Melancolia), que conseguem carregar essa história pesada. A trilha composta por Rob Simonsen (O Amor Pede Passagem) também favorece o cenário.

Outro elemento que impressiona no roteiro é sua coragem. Na vida real, como no filme, o personagem escapou das acusações mais graves, mas o roteiro não deixa muitas dúvidas de quem é o verdadeiro culpado. O nome dos personagens foi alterado, mas não requer muito esforço para que o leitor encontre na internet a descrição dos fatos.

Infelizmente, tal coragem de escancarar escândalos verdadeiros não é vista no Brasil. Em Cazuza – O Tempo não Para (2004), todos os casos homossexuais do cantor são com figuras anônimas. Outras celebridades que tiveram envolvimento sexual com Cazuza foram poupadas. Famosos que forneciam drogas para ele não são citados pelo roteiro.


Outro exemplo dessa extrema temeridade está na minissérie Maysa (2009). Durante os capítulos, não é relatado com clareza que a cantora roubou o marido de Nara Leão.

É nesse ponto em que precisamos tomar uma decisão. Vamos continuar protegento pessoas ricas e famosas do embaraçamento causado por suas próprias atitudes? Ou vamos optar por ser mais fiéis aos fatos, mesmo que seja por insinuações?

Por enquanto, escolhemos a primeira opção. Entre outras coisas, essa postura corrobora outros acontecimentos, como a proibição da venda da biografia não-autorizada do cantor Roberto Carlos. O ruim mesmo é perceber que, em um país que até hoje não puniu os torturadores da ditadura, esse comportamento faz sentido.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

L'Apollonide x Bruna Surfistinha: Prostituição sem romantismo

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Prostitutas são heroínas em histórias contadas por livros, músicas e outros meios. No cinema recente, L'Apollonide - Os Amores da Casa de Tolerância (L'Apollonide (Souvenirs de la maison close)) e Bruna Surfistinha seguem essa tradição de maneiras distintas.

No entanto, há um elemento que une essas duas produções. Ambas fogem do romantismo que pode ser encontrado em outros filmes, como Uma Linda Mulher (1990) e Moulin Rouge (2001), por exemplo.

A produção brasileira foca-se nos comportamentos sexuais diferentes aos quais as meretrizes precisam se submeter em sua rotina. Baseado no relato autobiográfico de Raquel Pacheco no livro Bruna Surfistinha: O Doce Veneno do Escorpião, o filme torna-se irregular quando tenta retratar a fase drogada de sua protagonista.

L'Apollonide tem seus méritos exatamente nos percalsos que as prostitutas enfrentam que muitas vezes não estão diretamente relacionados ao gosto sexual de seus clientes. As doenças venéreas e a solidão são como fantasmas que não se cansam em assombrar a consciência  das profissionais do sexo.


O filme se passa na virada para o século XX, nos últimos anos da chamada belle époque. Da mesma maneira que o cenário social definhava na direção da Primeira Guerra Mundial, o roteiro narra os últimos dias de funcionamento de um prostíbulo francês.

O período no qual a história é contada favorece o engrandecimento dos tais fantasmas. Com cuidados sanitários pífios e nenhuma menção a preservativos, as doenças venéreas são uma preocupação constante. Atualmente, as meretrizes sabiamente exigem o uso de camisinhas.

Em uma época em que prostitutas eram apenas prostitutas, o solidão parece ser um destino inescapável. Não existia, por exemplo, as universitárias que vendem seu corpo por um curto período de tempo e depois seguem suas vidas sem sofrer as consequências do preconceito da profissão.

L'Apollonide trata de todas essas questões na forma de tramas paralelas. Cada uma das trabalhadoras do bordel onde o filme se passa representa um desses e de outros conflitos. Por essa razão, pode levar um tempo para que o espectador consiga diferencias cada uma das personagens.