quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Cidadão Boilesen







Sinopse: Documentário sobre Henning Boilesen, presidente da Ultragás que ajudou financeiramente o regime militar no Brasil. Sua participação na tortura de presos político e um plano para assaniná-lo.


Ficha Técnica
Cidadão Boilesen
Roteiro e Direção: Chaim Litewski
Elenco: -documentário-
Duração: 92 minutos


Contra o esquecimento
 por Edu Fernandes

(Spoilerômetro: )
 
Os horrores cometidos pelos militares durante a ditadura já foi muito explorado pelo cinema brasileiro nesses 25 anos de redemocratização. De forma mais dramática (Zuzu Angel) e até mais inocente (O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias) o tema não chega a ser novidade nas telas.

O documentário Cidadão Boilesen consegue escapar da mesmice por abordar uma vertente esquecida da questão. O regime totalitário seria impraticável e insustentável sem a ajuda da elite, que atualmente não apoia militares. Um desses financiadores da ditadura foi a dinamarquês naturalizado brasileiro Henning Boilesen.

Um dos maiores méritos do filme é de tratar de um assunto tão sério sem ser entediante e ainda com atrativos sonoros e visuais. Infelizmente sabe-se que essa postura ainda é minoritária, com a infeliz ideia que seriedade não pode ser enfeitada. (Fica o recado para a visualmente hedionda coleção de livros Debates)

A pesquisa para o longa foi muito bem realizada, com matérias de jornais, cenas de filmes ficcionais sobre o assunto e até o contato com documentos confidenciais. As fotos de arquivo ganham animação, mas acabam ficando um tanto repetitivas mais para o final. No lado auditivo, a trilha musical animada não deixa a peteca cair.

Outra característica importante de Cidadão Bolesen é dar voz aos vários lados da questão, com pontos de vista muitas vezes conflitantes entre os depoimentos. O filho de Henning, revolucionários esquerdistas da época, políticos atuais e até militares reformados contam suas histórias.

Esse documentário é uma obra ímpar, que não deixa que a memória de nossa História seja deteriorada.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Polícia, Adjetivo






Sinopse: Cristi é um policial investigando um caso de tráfego e consumo de drogas. Seus problemas acontecem por não concordar com seu superior de como será a melhor forma de conduzir o caso.


Ficha Técnica
Polícia, Adjetivo (Politist, Adjectiv)
Roteiro e Direção: Corneliu Porumboiu
Elenco: Dragos Bucur, Vlad Ivanov, Irina Saulescu, Ion Stoica, Marian Ghenea
Duração: 115 minutos


Investigação e paciência
 por Edu Fernandes

(Spoilerômetro: )

O título de Polícia, Adjetivo (Politist, Adjectiv) pode parecer bem estranho para qualquer pessoa com noções básicas de gramática. Na verdade, o que aconteceu foi um problema na tradução dessa produção romena. O mais adequado seria chamar o filme "Policial, Adjetivo".

A sinopse também pode levar o espectador desavisado a acreditar que se trata de um filme de ação policial com muitos tiroteios, ou um drama que discuta a questão das drogas na sociedade. O filme de fato fala do trabalho policial, mas não da forma romântica que estamos acostumados com o cinema mais popular. O objetivo desse longa é mostrar que a rotina dos detetives é bem diferente das ficções, precisando de muita paciência para conseguir seus objetivos.

O próprio público necessitará de uma grande dose de paciência para tolerar quase duas horas de uma narrativa extremamente arrastada. Logo na primeira cena, vê-se o trajeto do protagonista até a delegacia. Ele anda por muitas ruas, sem qualquer necessidade para o desenvolvimento da história. Nem mesmo os créditos iniciais são apresentados nessa cena.

O elenco, a direção e o roteiro merecem elogios por conseguirem inserir muitos assuntos desconexos na mesma situação. Por exemplo, em um jantar ou reunião de trabalho (filmada em plano-sequência*) os personagens podem falar de temas importantes para o que estão vivendo e rapidamente descambar para ameninades com extrema facilidade. Turismo, música e gramática fazem parte das falas, enquanto o cerne da questão é deixado de lado.

Polícia, Adjetivo experimenta em várias frentes, quem estiver acordado poderá ver.

* sem cortes

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Anticristo







Sinopse: Depois da morte do filho de 2 anos em um acidente, um casal retira-se para uma casa de campo para se recuperar do trauma.


Ficha Técnica
Anticristo (Antichrist)
Roteiro e Direção: Lars von Trier
Elenco: Willem Dafoe, Charlotte Gainsbourg
Duração: 109 minutos


Jornada à insanidade
  por Edu Fernandes

(Spoilerômetro:)


Para quem conhece o tamanho do ego do diretor Lars von Trier, Anticristo (Antichrist) será uma lufada de ar renovado no currículo do dinamarquês. Exceto pelos créditos iniciais, compostos apenas pelo nome do filme e o nome do cineasta, ele se comporta. Enquanto no fracasso de O Grande Chefe ele chega a narrar a história, dessa vez ele deixa que o enredo flua livremente com posicionamentos de câmera interessantes.

No entanto, o maior mérito de Trier nesse filme está na forma como ele consegue convidar seu espectador de forma gradativa a adentrar na loucura na trama. Conforme avançam os capítulos, vamos nos aprofundando na psique dos personagens até chegarmos à nebulosa e torturante (no bom sentido) sequência final.

Para se ter uma noção da diferença gritante entre o começo e o final de Anticristo, basta comparar as sensações que esses momentos opostos geram. A primeira cena é altamente plástica, com uma bela direção de fotografia assinada por Anthony Dod Mantle (O Último Rei da Escócia), em câmera lenta e com uma tocante trilha de fundo – uma daquelas passagens únicas em experiência cinematográfica. Por outro lado, ao final da exibição muitos estômagos estarão doendo e muitos corações ficarão inquietos. A tensão permanecerá na mente do espectador mesmo depois de sair do cinema.

Finalmente, em um filme com um elenco composto praticamente por apenas dois atores, o trabalhos desses profissionais é uma peça-chave para o valor geral da obra. Será suficiente dizer sobre o assunto que Charlotte Gainsbourg (A Noiva Perfeita) foi premiada em Cannes e que Willem Dafoe (Um Segredo entre Nós) não fica para trás.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Beyond Ipanema – Ondas Brasileiras na Música Global






Sinopse: Documentário que perpassa a História da música brasileira e suas influências nos EUA.


Ficha Técnica
Beyond Ipanema – Ondas Brasileiras na Música Global (Beyond Ipanema – Brazilian Waves in Global Music)
Direção: Guto Barra
Roteiro: Guto Barra, Béco Dranoff
Elenco: -documentário-
Duração: 90 minutos


 por Marcelo Rafael

(Spoilerômetro: )

 “O quê é que a baiana tem?” já perguntava a portuguesa mais brasileira do século XX, Carmem Miranda. E o que é que o brasileiro tem pra despertar tanta curiosidade e fascinação nos gringos, mesmo com a Amazônia sendo devastada e helicópteros sendo derrubados nas favelas do Rio? Segundo David Byrne, é a cultura e, mais especificamente, a música, que é exportada como um produto de qualidade, assim como o café e o açúcar.

Beyond Ipanema – Ondas Brasileiras na Música Global (Beyond Ipanema – Brazilian Waves in Global Music) é um documentário que traça uma ponte Rio-NY e desenha um panorama da difusão da música nacional em terras internacionais. Desde os balangandãs de Carmem Miranda, que fazia questão de ter falas e algumas músicas em português em seus filmes, até os anos 2000.

Com a Internet e o compartilhamento de vídeo e música cada vez mais acessíveis hoje em dia, fica fácil para bandas de qualquer país ficarem conhecidas em outro lugar. Mas nas décadas passadas, quando Mutantes e Novos Baianos começaram a ganhar destaque no mercado norte-americano, não era tão fácil achar informação ou discografia disponível nos EUA. Ou mesmo aqui no Brasil, como contam entrevistados como David Byrne, Nelson Motta, Ruy Castro, Caetano Veloso, Tom Zé, e Gilberto Gil (inexplicavelmente falando apenas em inglês e pronunciando coisas como “hair” ao invés de “her” e “cowture” ao invés de “culture”).

Passando pela bossa nova, traça-se paralelo deste gênero com o jazz norte-americano. Com a Tropicália, ressalta-se a rebeldia e a contracultura (apesar de não falar palavra sobre a Ditadura) que encantaram os gringos e levaram ao retorno dos Mutantes em 2006. Há ainda Bebel Gilberto, Seu Jorge, Cansei de Ser Sexy e até “escola de samba” no Harlem! E o documentário vai além dos nomes canônicos, enveredando também pelo funk carioca e o forró nas noites nova-iorquinas.

O mix de estilos, o tempo todo ressaltado como característica da cultura nacional (Gil chega a lembrar da antropofagia da Arte Moderna) se dá também nas imagens captadas em super-8, 35mm e digital.

Entre um tópico e outro, surgem mulatas, Carnaval e praias estampando a tela e cristalizando as imagens gravadas na retina e no imaginário coletivo estrangeiro. Isso poderia classificar o filme como “para inglês ver” ou para brasileiro que necessita de reconhecimento externo se valorizar. Mas não há muito como fugir de estereótipos, já pavimentados lá trás por Carmem Miranda.

Prova disso se dá com Adriano Sintra e Lovefoxx, do CSS, afirmando que só perceberam que suas letras falavam de sexo quando a crítica internacional alertou sobre isso. Ou quando os integrantes da banda Garotas Suecas comentam que só passaram a conhecer mesmo música brasileira em Nova York.

É interessante também ver que Bebel Gilberto, famosa pelos seu mix musical, torcia o nariz pra música tecno e eletrônica até conhecer o Towa Tei, ex-integrante da banda Deelite, com quem fez parceria.

O espectador pode sentir falta de nomes como Maria Bethânia e Chico Buarque, que segundo o co-produtor Béco Dranoff, não foram mencionados por não terem tido tanta repercussão nos EUA. Outro fenômeno da música nacional que rodou o mundo, a lambada, liderada pelo Kaoma, também não é abordado. Para Dranoff, o estilo não agradou tanto aos norte-americanos quanto os europeus e asiáticos e por isso também ficou de fora.

No geral, vale assistir. Seja para constatar que o modo como nos veem lá fora é endossado por nós mesmos em alguns pontos, seja para conhecer um pouco mais da trajetória de nossa própria produção musical, solapada, muitas vezes, pela cultura deles, os gringos.