terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Entrevista: Billi Pig: "Tributo a chanchada"

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro:  (?)


Um traficante de drogas (Otávio Muller, de Reis e Ratos), um corretor de seguros ganancioso (Selton Mello, de Federal) e um padre mulherengo (Nelson Gonçalves, de Assalto ao Banco Central). Esses são os três principais personagens malandros de Billi Pig, um “tributo a chanchada”, segundo disse Selton Mello em coletiva de imprensa com o elenco e o diretor do filme.

A filha do traficante é baleada e corre o risco de ficar paraplégica. Para evitar essa sina, o criminoso está disposto a gastar uma grande soma de dinheiro para conseguir um milagre. É nesse ponto que o corretor e o padre entram na jogada. No entanto, a personagem principal do filme é a aspirante a atriz Marivalda (Grazi Massafera, de Aquele Beijo), esposa do corretor Wanderley.

A ideia do filme surgiu para o diretor e roteitista José Eduardo Belmonte a partir de uma experiência pessoal. “O filme surgiu no Festival do Rio, quando eu apresentei Se Nada mais Der Certo”, disse o cineasta. “O filme era pequeno e ainda tinha muitas dívidas, mas eu estava em um hotel luxuoso. Achei a situação engraçada”. Para Billi Pig, Belmonte teve mais verba. “É tão difícil fazer filme com dinheiro quanto sem”, explica. “São demandas diferentes”.

O Billi do título é um porquinho de brinquedo que Marivalda carrega para todo lado e que conversa com ela. “O porquinho é um elemento fantástico, que eu acho que combina com a fé brasileira” disse Belmonte. "É uma forma de criar uma consciência para a Marivalda".


A personagem é classificada por Massafera como “uma sátira de um momento em que eu achava que a carreira de atriz é só glamour”. Grazi faz sua estreia como protagonista em cinema. “É complicado escolher um projeto para começar, mas me apaixonei pelo roteiro”.

“Trabalhar com Selton e Milton é um nível alto”, fala a atriz sobre seus colegas de elenco. “O Zé (Belmonte) me ajudou a desmistificar os meus ídolos”.

A missão de Massafera foi cumprida com louvor, segundo Selton Mello. “O que mais me toca nesse filme foi o nascimento de uma grande atriz” opina. “A Grazi tem uma humildade e profundidade que poucas atrizes têm. Eu e o Milton temos experiência e vícios, mas ela tem frescor, que é mais valioso para um ator”.

Contudo, nem tudo são flores. A proposta de comparar a malandragem do padre, do corretor e do traficante combina com o cinema de Belmonte, com crítica social no roteiro. O problema é que a história não ousa em se aprofundar em seu absurdo e perde tempo com personagens secundários desnecessários.

O exemplo máximo está em Dona Generosa, a dona da funerária interpretada por Preta Gil. “Minha personagem era menor no roteiro, mas trabalhamos muito com improviso”, afirma Preta.

Generosa está ligada a conflitos do padre Roberbal e sequer contracena com Selton Mello e Grazi Massafera, atores principais de Billi Pig. Quase todas suas cenas são com seu assistente, interpretado por Millhem Cortaz (Cilada.com). “Minha parceria com o Milhem rendeu cenas maiores” avalia. “A gente formou uma cena bacana”.

Com a participação dilatada de Gil e Cortaz, o final de Billi Pig se atropela e cenas são cortadas. A história fica confusa e a proposta do diretor diluída.


Billi Pig
Direção: José Eduardo Belmonte
Roteiro: José Eduardo Belmonte, Ronaldo D'Oxum
Elenco: Selton Mello, Grazi Massafera, Milton Gonçalves, Milhem Cortaz, Preta Gil, Tadeu Mello, Otávio Muller
Duração: 98 minutos
País: Brasil

Nota: 4

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Oscar 2012: Ode ao cinema

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Os dois maiores concorrentes à 84ª edição do prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas contêm em seu roteiro uma dose de metalinguagem e reafirmam o amor pelo cinema. Em várias categorias A Invenção de Hugo Cabret disputa os Oscars com O Artista. Veja a lista de apostas:

Filme O Artista
Ator – Jean Dujardin (O Artista)
Atriz – Viola Davis (Histórias Cruzadas)
Ator Coadjuvante – Christopher Plummer (Toda Forma de Amor)
Atriz Coadjuvante – Octavia Spencer (Histórias Cruzadas)
Direção – Michel Hazanavicius (O Artista)
Roteiro Original O Artista
Roteiro AdaptadoA Invenção de Hugo Cabret
Animação Rango 
Filme EstrangeiroA Separação
Direção de FotografiaA Invenção de Hugo Cabret 
Edição A Invenção de Hugo Cabret 
Direção de ArteA Invenção de Hugo Cabret 
Figurino Jane Eyre 
Maquiagem A Dama de Ferro
Trilha MusicalO Artista 
Canção Rio 
Edição de SomCavalo de Guerra
Mixagem de SomCavalo de Guerra
Efeitos VisuaisHarry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2
Documentário Pina 
Animação em curta-metragemLa Luna 

Não tenho apostas em documentário e ficção de curta-metragem.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

A Mulher de Preto: Medo inanimado

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro:  (?)


Da mesma forma que acontece com O Despertar, o filme A Mulher de Preto (The Woman in Black) tem uma história banal, dessas que se conta em fogueiras de acampamento. Todavia, ao contrário da produção estrelada por Rebecca Hall, o filme protagonizado por Daniel Radcliffe (Harry Potter e as Relíquias da Morte) consegue manter alguma personalidade para que se diferencie entre outros títulos do gênero.

Radcliffe interpreta Arthur, um advogado viúvo que deve arrumar a documentação de um casarão para que o imóvel possa ser vendido. A aldeia próxima à tal mansão é habitada por pessoas desconfiadas que parecem fazer de tudo para encurtar a estadia de Arthur.

O advogado não arreda pé do local porque seu emprego está em risco. Em sua insistência, Arthur descobre que muitas crianças da vila têm mortes trágicas e o povo local responsabiliza um espírito que assombra a mansão pelos terríveis acontecimentos.


Eis a premissa que não esbanja originalidade. O diferencial de A Mulher de Preto está principalmente na direção de arte, que escolheu brinquedos antigos e macabros para “enfeitar” o casarão fantasmagórico. A opção faz sentido porque grande parte das cenas de tensão acontecem quando o protagonista está sozinho. Assim, aposta-se em objetos assustadores.

O que impressiona é o fato de que os brinquedos são autênticas peças de antiquário e não réplicas exageradas produzidas especialmente para o filme. As peças foram cedidas por um colecionador.

Outro ponto positivo em A Mulher de Preto é a escolha de enquadramentos feita pelo diretor James Watkins (Sem Saída). Desde a cena inicial, vislumbra-se momentos em que a câmera cria imagens bonitas para contar uma história sombria.


A Mulher de Preto (The Woman in Black)
Direção: James Watkins
Roteiro: Jane Goldman
Elenco: Daniel Radcliffe, Janet McTeer, Ciarán Hinds
Duração: 95 minutos
País: Reino Unido, Canadá, Suécia

Nota: 6

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

O Porto: A medida da antítese

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro:  (?)


Dá-se o nome de antítese quando um discurso aproxima dois termos de ideias opostas, como “fogo gélido” ou “gigante anão”. Por sua natureza, tal figura de linguagem é muito capciosa e seu mal uso pode gerar resultados horrendos. Felizmente, o filme O Porto (Le Havre) consegue empregar muito bem o recurso.

O uso da antítese nesse caso é válido porque o longa aborda a imigração, um tema que é ao mesmo tempo atual e antigo na França, onde se desenvolve sua história. Por séculos, os franceses exploraram terras na África e nas Américas para enriquecer sua nação com os recursos retirados desses locais. Atualmente, muitos habitantes dessas ex-colônias partem para a França em busca de melhores chances de vida, mas encontram uma regulação de imigração cada vez mais restritiva.

O Porto mostra um grupo de imigrantes ilegais que saem da África em um contêiner para chegar a Londres. Entretanto o navio acaba na Normandia, onde os africanos são descobertos e detidos, exceto por Idrissa (o estreante Blondin Miguel). O garoto consegue fugir e encontra Marcel (André Wilms, de Europa Europa), um velho engraxate que decide ajudá-lo.


O personagens principais são um exemplo de uma dupla antitética: um homem velho e de pele branca ao lado de um menino de pele negra. Marcel é casado com a estrangeira Arletty (Kati Outinen, de O Homem sem Passado), o que também evidencia a antítese no tratamento de imigrantes distintos. Ela, de pele branca, é exaltada como uma mulher maravilhosa, enquanto os negros são apenas ladrões de empregos.

O próprio vilão é antitético. O policial Monet (Jean-Pierre Darroussin, de Conversas com Meu Jardineiro) tem nome de pintor, apesar de seu trabalho não ser nada artístico. De cara amarrada e roupas escuras, ele está a caça de Idrissa, mas arruma um jeito de dar dicas a Marcel para que consiga protegê-lo.

Finalmente, a direção de Aki Kaurismäki (Luzes na Escuridão) não poderia sair do tom. A trama de O Porto acontece nos dias de hoje, mas o visual e o ritmo do filme parecem antiquados. Planos estáticos e atuações à moda antiga ditam o saudosismo audiovisual da obra.

Com não poderia deixar de ser, O Porto é uma comédia dramática.


O Porto (Le Havre)
Roteiro e Direção: Aki Kaurismäki
Elenco: André Wilms, Kati Outinen, Jean-Pierre Darroussin, Blondin Miguel, Elina Salo, Evelyne Didi, Quoc Dung Nguyen
Duração: 93 minutos
País: Finlândia, França, Alemanha

Nota: 7

Para ver outro olhar sobre a questão da imigração na França, confira Bem-Vindo (2009).


terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Como a Geração Rock’n’Roll: O meio e o indivíduo

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro: (?)


Nos anos 1960, a produção cultural estava a todo vapor. No cinema estadunidense esse período fértil foi desbravado por jovens diretores em uma movimento chamado Nova Hollywood, iniciado pelo filme Bonnie e Clyde – Uma Rajada de Balas (1967).

O livro Como a Geração Sexo, Drogas e Rock’n’Roll Salvou Holywood – Easy Riders, Raging Bulls (Easy Riders, Raging Bulls: How the sex-drugas-and-rock’n’roll generation saved Hollywood) traça um honesto historico desse momento. O livro conta como um grupo de jovens realizadores lutou contra um sistema que dificultava ao máximo que autores deixassem suas marcar pessoais nos filmes.

O grande atrativo do volume escrito por Peter Biskind está nas revelações bombásticas sobre figuras importantes de Hollywood. Como o título anuncia, tais revelações frequentemente tratam do uso de drogas ilícitas e sobre a vida sexual desses ícones.


No entanto, quando começa a tratar do grande sucesso de bilheterias de Tubarão (1975) e Star Wars (1977), o livro assume uma postura de ir contra o cinema de entretenimento. Segundo o livro, é como se o sucesso popular desses títulos fosse o responsável pelos fracassos das carreiras de outros diretores do movimento.

Para o leitor mais atento, é possível perceber que a ganância e a vaidade são as verdadeiras culpadas pela derrocada. Conforme os salários dos cineastas inflavam e seus nomes e rostos estampavam capas de revistas, o lado profissional ficava em segundo plano. Nas páginas do livro, é comum ler relatos de diretores que surtavam no estúdio e/ou estouravam o orçamento de seus filmes.

Antes dos anos 1960, o diretor de um filme era visto como um cargo puramente técnico, tão importante quanto um eletricista. Portanto, uma postura profissional era exigida deles. Quando a Nova Hollywood estava no topo, não era esse tipo de atitude que se via.


No último capítulo de Como a Geração..., Francis Ford Coppola (O Poderoso Chefão) fala que Woody Allen é um dos únicos realizadores que ainda consegue fazer cinema de autor nos Estados Unidos. “A carreira dele é a que eu mais respeito. Sempre desejei ter feito o que ele fez”, disse.

Pois bem, Allen não atrasa suas gravações, mantém um orçamento baixo por meio de acordos na pré-produção e entrega praticamente um filme novo por ano. Se a intenção é fazer longas com discurso próprio, há um preço a se pagar.

Como a Geração Sexo, Drogas e Rock’n’Roll Salvou Holywood – Easy Riders, Raging Bulls (Easy Riders, Raging Bulls: How the sex-drugas-and-rock’n’roll generation saved Hollywood)
Autor: Peter Biskind
Tradução: Ana Maria Bahiana
Editora: Intrínseca
Páginas: 502

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Bubba Ho-Tep: Criatividade não se compra

 por Edu Fernandes

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Quando um filme é acometido por um orçamento apertado, é imperativo abusar de algo valioso que não se pode ser medido em cifras: a criatividade. Bubba Ho-Tep foi realizado por cerca de US$ 500 mil. Portanto, muita originalidade teve de ser empenhada para concretizar o filme.

A criatividade já existia no conto de Joe R. Lansdale que deu origem ao roteiro. A história parte da premissa de que Elvis não morreu. Na verdade ele trocou de identidade com um de seus mais talentosos imitadores na década de 70. Atualmente, o velho Rei do Rock (Bruce Campbell, de Burn Notice) mora em um asilo onde ninguém acredita em sua história de vida secreta.

Seu único confidente é Jack (Ossie Davis, de The L World), paciente do asilo que acredita ser o ex-presidente dos Estados Unidos Jack Kennedy. Quando confrontado com o fato de ele ser negro enquanto o finado político ser branco, ele diz que a CIA tingiu sua pele. Como é o único que acredita em Elvis, o protagonista não tem outra opção de parceiro.

Até aí já se tem a união de dois personagens curiosos, mas ainda há mais ingredientes nessa mistura maluca que o filme propõe. Um mistério assola o asilo: alguns dos pacientes estão sendo atacados e mortos por uma espécie de monstro na calada da noite.


O que começa como drama cômico absurdo, passa para terror e finalmente chega em aventura quando Elvis e Jack decidem investigar o mistério. Os dois idosos preparam-se para enfrentar o monstro.

O teor da história colabora para as restrições orçamentárias. Com quase toda a ação de passando em um único lugar (o asilo), economiza-se em locações e logística. A trilha musical também foi influenciada pela verba curta. Apesar de ser o personagem principal do enredo, não há qualquer música de Elvis executada no decorrer do filme, porque os direitos autorais seriam caros demais. Os efeitos especiais são toscos, mas a proposta trash do filme faz o espectador relevar essa característica e até rir dela.

Por todas suas particularidades, Bubba Ho-Tep é um filme difícil de aceitar. Por essa razão, a produção de 2002 permanece inédito no Brasil. No entanto, quem for curioso e menta-aberta o suficiente pode encontrar nele uma fonte de boas risadas.


Bubba Ho-Tep
Roteiro e Direção: Don Coscarelli
Elenco: Bruce Campbell, Ossie Davis, Ella Joyce, Heidi Marnhout, Bob Ivy
Duração: 92 minutos
País: EUA

Nota: 7

Bubba Ho-Tep foi assistido em DVD.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Shame X Drive: Em nome da elegância

 por Edu Fernandes

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Os cinemas brasileiros receberão em breve dois títulos com grande teor de elegância em seus cernes. Trata-se de duas obras de tom urbano e que foram elogiadas em suas passagens por festivais europeus em 2011.

O protagonista de Shame é um bem-sucedido homem de negócios. Ele traja as roupas mais finas, faz suas refeições nos restaurantes mais luxuosos, mora em um bom apartamento e trabalha em um escritório meticulosamente decorado.


É de se supor que esse seja um bom exemplo de elegância na forma de gente, mas logo na primeira cena do filme se vê Brandon (Michael Fassbender, de X-Men: Primeira Classe) na cama, com apenas um lençol sobre seu corpo nu. A partir daí a produção deixa claro seu intento de desnudar esse personagem.

Na verdade, Brandon é um homem solitário, viciado em sexo e pornografia. Suas falhas ficam mais evidentes quando recebe a irmã que chega a Nova York. Os dois são aparentemente pessoas diametralmente opostas, mas quando a máscara cai, transparecem as semelhanças entre Brandon e Sissy (Carey Mulligan, de Não Me Abandone Jamais).

O protagonista de Drive trabalha como dublê de cenas de perseguição automobilística em Los Angeles. Quando não está nos estúdios, têm outras atividades. De dia, é mecânico em uma oficina. De noite, auxilia criminosos a fugir graças a sua perícia atrás de um volante. O personagem interpretado por Ryan Gosling (Tudo pelo Poder) é um herói torto, um homem durão, sem nome e sem passado.


É de se esperar que Drive seja um filme bruto e áspero, mas a produção presta uma homenagem aos “filmes de trabuco” da década de 1980 com enorme elegância. A movimentação da câmera, a fotografia, o som e a trilha musical montam um cenário que esbanja fineza e traça um contraponto com a violência do roteiro.

Carey Mulligan também está em Drive, como a vizinha do protagonista. Com esses dois filmes, a jovem atriz exibe toda a extensão do seu talento, já que interpreta personagens bem distintos. Outra semelhança entre os títulos é o desempenho dos atores principais, que infelizmente foram igualmente ignorados nas indicações ao Oscar.

Curiosamente as duas fitas serão lançadas no Brasil com seus nomes originais, sem qualquer tradução, adaptação ou subtítulo. Eis uma postura louvável das distribuidoras, que apostam na força de seus produtos apenas pelas qualidades cinematográficas que apresentam.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Reis e Ratos: Limites de proposta

 por Edu Fernandes

Spoilerômetro:  (?)


Seja uma recepção positiva ou negativa, é preciso dizer que Reis e Ratos é um filme ousado. O roteiro faz piada com a ditadura militar e praticamente todo o elenco entrega atuações propositalmente caricatas.

Na história, representantes estadunidenses planejam vários atentatos para causar medo na população e legitimar a tomada do poder pelos militares. O objetivo é afastar a ameaça comunista do Brasil. Um estranho obstáculo impede que os planos se concretizem: um radialista (Cauã Reymond, de Meu País) possuído por um espírito relata todos os atentados em seu programa antes que eles aconteçam.

Como em Estamos Juntos, Cauã Reymond mais uma vez interpreta um homossexual, mas consegue um registro bem diferente. O foco está na voz de radialista e menos na afetação. Para compor a atmosfera de atuações que soem exageradas, dubladores foram escalados em papéis secundários. Dessa forma, o espectador fica com uma pulga atrás da orelha por causa da familiaridade com as vozes.


Outro ator que fez um trabalho de voz é Selton Mello (O Palhaço), como um agente da CIA infiltrado no Brasil. Além da voz, Selton sempre fica com os olhos semi-cerrados e oferece um bom medidor para a recepção do resultado do filme. A proposta ousada de Reis e Ratos, na minha visão, passa do ponto em diversos momentos. Mesmo assim, é possível que algumas pessoas gostem da produção.

Se a atuação de Selton não ofender que espectador, abre-se a possibilidade de uma recepção positiva. Entretanto, se isso já incomodar, não há salvação. O roteiro é tão gradativamente tresloucado quanto às atuações e fica difícil assimilar todos suas maluquices.


Reis e Ratos
Roteiro e Direção: Mauro Lima
Elenco: Selton Mello, Cauã Reymond, Paula Burlamaqui, Orã Figueiredo, Seu Jorge, Otávio Muller, Hélio Ribeiro, Élcio Romar, Rodrigo Santoro
Duração: 111 minutos
País: Brasil

Nota: 3

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Hugo Cabret X Tão Forte: Figura paterna

 por Edu Fernandes

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Muito antes de Harry Potter tornar-se um fenômeno mundial e Batman habitar o imaginário de jovens por diversas gerações, órfão heroicos são figuras recorrentes no meio cultural. Em 2012 a Academia de Hollywood indicou ao Oscar filmes protagonizados por dois garotos valorosos.

A Invenção de Hugo Cabret (Hugo) se passa na França do período entre-guerras. Hugo (Asa Butterfield, de Nanny McPhee e as Lições Mágicas) mora entre as paredes de uma estação de trem em Paris. Ele aprendeu com seu finado pai (Jude Law, de Sherlock Holmes 2) o ofício de relojoeiro e faz a manutenção dos aparelhos sem o conhecimento do inspetor (Sacha Baron Cohen, de Bruno). O representante da autoridade está sempre à caça de garotos órfãos para encaminhá-los a instituições competentes.

A fuga constante de Hugo se explica porque ele tem uma missão nobre: consertar um autômato deixado por seu pai. A esperânça do garoto é colocar o robô-escrivão para funcionar e receber algum tipo de mensagem do pai, mas precisa de uma chave em forma de coração para fazer a máquina funcionar.


Para ajudá-lo nessa aventura, Hugo conta com a amiga Isabelle (Cloë Moretz, de Deixe-me Entrar). A garota também é orfã, mas teve a sorte de ser adotada por George (Ben Kingsley, de O Príncipe da Pérsia), o dono da loja de brinquedos da estação.

Dirigido por Martin Scorsese (Ilha do Medo), A Invenção de Hugo Cabret traz o melhor uso do 3D para contar uma boa história que já se viu no cinema recente. A neve que cai sobre a plateia e as cenas bem arquitetadas colocam o espectador dentro do filme.

O outro bravo órfão do cinema é Oskar (o estreante Thomas Horn) do drama Tão Forte e Tão Perto (Extremely Loud & Incredibly Close). Ao contrário de Hugo, ele ainda tem sua mãe (Sandra Bullock, de Um Sonho Possível), mas a comunicação entre eles é complicada.


O pai dele (Tom Hanks, de Larry Crowne) morreu durante os ataques de 11 de setembro. A relação com o filho era muito positiva, mesmo com as dificuldades de socialização do garoto – que provavelmente sofre de Síndrome de Asperger. O hobby partilhado entre pai e filho é o de desvendar mistérios. Na verdade, os enigmas e desafios são exercícios criados pelo pai para forçar de forma lúdica o menino a interagir com outras pessoas.

Depois da morte do pai, Oskar continua com as buscas que estavam em andamento antes da tragédia. O garoto descobre uma chave entre os pertences do pai e parte em busca de sua fechadura. Essa jornada serve para que Oskar entre em contato com pessoas dos tipos mais variados com histórias de vida das mais variadas.

Os dois filmes têm atores-mirins de alto nível, que conseguem conduzir seus personagens, sob o tema em comum da superação da perda do pai-companheiro. Os dois precisam usar uma chave, como que para descobrir os mistérios da vida. A aceitação do grau de fantasia, maior em Hugo Cabret e menor em Tão Forte, é essencial para que se conecte emocionalmente com os enredos.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

O Despertar: Coleção de lembranças

 por Edu Fernandes

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É praticamente impossível assistir a um filme sem se lembrar de outros. Entretanto, o alto número de recorrências em O Despertar (The Awakening) testa a paciência do espectadores acostumados a ver filmes de suspense e terror com elementos fantasmagóricos em sua história.

Como em A Chave Mestra (2005), a protagonista é uma mulher que não acredita em fantasmas. A diferença é que Florence (Rebecca Hall, de Atração Perigosa) dedica sua vida a desmascarar charlatões que se aproveitam da fé de pessoas que crêem no além-vida.

O ceticismo de Florence é colocado a prova quando ela é convocada para desmascarar um fantasma que circula pelos corredores de um internato, um imóvel que tem um passado tão sangrento quanto misterioso, como em todas as histórias de casas mal-assombradas.


Aparentemente o fantasma que tira o sossego dos alunos do internato é um garoto que foi morto quando o casarão era habitado por uma família rica. Espíritos de crianças é mais um ingrediente comum em filmes do gênero, como Os Outros (2001) e O Orfanato (2007). Aliás, esse último título é uma das lembranças cinematográficas mais constantes ao assistir O Despertar. O problema é que não se tem uma cena tão marcante quando a do esconde-esconde da produção espanhola.

Por outro lado, há algumas cenas de banho para que se possa apreciar a beleza de Rebecca Hall. Desde Psicose (1960) que mulheres atraentes banhando-se em filmes de terror não são novidade.

No final do enredo há uma surpresinha apenas para justificar a existência do filme e deixar o público com uma impressão final positiva.


O Despertar (The Awakening)
Direção: Nick Murphy
Roteiro: Stephen Volk, Nick Murphy
Elenco: Rebecca Hall, Dominic West, Imelda Staunton, Lucy Cohu, John Shrapnel, Isaac Hempstead Wright
Duração: 107 minutos
País: Reino Unido

Nota: 5

O Artista: Aula de cinema

 por Edu Fernandes

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A existência de um filme mudo realizado nos dias de hoje já é atrativo suficiente para cinéfilos, mas O Artista (The Artist) traz mais elementos que reafirmam o amor pela sétima arte. Em seu roteiro e suas escolhas estéticas, a produção faz referências ao cinema produzido mesmo depois do fim da era muda.

A trama gira em torno de um ator francês (Jean Dujardin, de Agente 117) que é um astro na Hollywood do final da década de 1920. Com o advento do cinema sonoro, o protagonista se vê em uma enrascada: por causa de seu sotaque ele não poderá seguir no mesmo posto de prestígio.

Esse tipo de problema assolou a carreira de vários atores do cinema mudo. Alguns deles teimaram em continuar a fazer filmes dessa maneira, como Charles Chaplin. O protagonista de O Artista também tentou continuar com o cinema mudo, mas fracassa.


Tanto quando se vê os filmes dentro do filme quanto nas demais cenas da fita, os atores entregam atuações teatralizadas que emulam os trabalhos de intérpretes da época em que o enredo se passa. Essa opção é um pouco mais flexível em outras áreas.

Na fotografia, há momentos em que se flerta com o expressionismo alemão, por exemplo, apesar de a história de O Artista conversar mais com o melodrama estadunidense. No posicionamento da câmera, há cenas que parecem saídas de produções dos anos 1940. Já na trilha musical, há até referência a Um Corpo que Cai (1958), de Alfred Hitchcock.

Mesmo com ingredientes de épocas e estéticas distintas, O Artista consegue manter tudo coeso e equilibrado. A mistura funciona porque o amor ao cinema mantém tudo conectado – inclusive o envolvimento emocional do público.


O Artista (The Artist)
Roteiro e Direção: Michel Hazanavicius
Elenco: Jean Dujardin, Bérénice Bejo, John Goodman, James Cromwell, Penelope Ann Miller
Duração: 100 minutos
País: França, Bélgica

Nota: 10

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Histórias Cruzadas: Várias faces do racismo

 por Edu Fernandes

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A discriminação é um assunto complexo e o filme Histórias Cruzadas (The Help) dá conta de vislumbrar várias frentes deste tema nas histórias de cada personagem. O racismo é o principal tipo de discriminação abordado no roteiro, mas há outros.

Skeeter (Emma Stone, de Amor a Toda Prova) é uma mulher independente no sul dos Estados Unidos no começo da década de 60, por isso também é alvo de olhares condenadores. Ela não vê a necessidade de casar, apesar da pressão de sua família.

A jovem sonha em ser escritora e tem uma ideia bombástica para um livro: contar a história das criadas negras, que criam as crianças brancas de famílias mais ricas sem poder usar o mesmo banheiro que os patrões. Nos contos sofridos dessas mulheres é que se vê parte do racismo denunciado pelo filme.


As outras jovens da cidade mostram outras formas desse tipo de preconceito. Seja aquela que é pressionada pelas amigas a discriminar a empregada, seja a que pensa que não é racista, apesar de considerar os negros seres inferiores que necessitam dos cuidados e amparo dos brancos.

O medo dos ataques da Ku Klux Klan está presente, mas não é o foco. A fita tem como objetivo mostrar a discriminação que encontramos mais facilmente, porém identificamos com mais dificuldade.

Entre as empregadas entrevistadas por Skeeter está Minny (Octavia Spencer, de Assalto em Dose Dupla), uma mulher que usa a discriminação como escudo. Ela é altamente desconfiada dos brancos. Seu preconceito nasce do trauma.

Finalmente há a história de Celia Foote (Jessica Chastain, de A Árvore da Vida), a patroa de Minny. Ela é uma mulher branca, rica e muito bem casada. Celia poderia ser muito feliz, mas não é isso o que acontece. Fofocas mancham sua reputação e ela se isola na mansão. Seu marido é tudo o que tem, por isso ela morre de medo de perdê-lo. Por isso, é capaz de esconder certas coisas dele, como suas inaptidões domésticas.

Com atuações impressionantes, Histórias Cruzadas passa sua mensagem e nos faz reparar em sutis discriminações que ainda residem em nossa sociedade.


Histórias Cruzadas (The Help)
Roteiro e Direção: Tate Taylor
Elenco: Emma Stone, Viola Davis, Bryce Dallas Howard, Octavia Spencer, Jessica Chastain, Ahna O'Reilly, Allison Janney
Duração: 146 minutos
País: EUA, Índia, Emirados Árabes Unidos

Nota: 8